O Instituto Brasileiro de Advocacia Pública (IBAP) expressa seu veemente repúdio ao descaso das autoridades responsáveis pela fiscalização e trabalho de manutenção da infraestrutura viária, pela circulação irregular de carretas e caminhões cujas dimensões e peso são incompatíveis com a capacidade das estruturas viárias, bem como pelo transporte de produtos perigosos, que culminou no desabamento da ponte Juscelino Kubitschek de Oliveira, em 22 de dezembro de 2024. O acidente resultou na morte e desaparecimento de várias pessoas e no despejo de 76 toneladas de ácido sulfúrico e 22 mil litros de pesticidas no rio Tocantins, afetando gravemente os ecossistemas e as comunidades ribeirinhas.
O acidente expõe falhas gravíssimas nos princípios constitucionais que regem a Administração Pública, especialmente no que tange à eficiência, responsabilidade e transparência. Tais falhas comprometeram tanto a segurança pública quanto a proteção ambiental, colocando em risco não apenas a saúde da população, mas também a biodiversidade local e os recursos hídricos essenciais à sobrevivência de milhões de brasileiros.
A Advocacia Pública desempenha papel imprescindível na proteção do interesse público, na recuperação dos danos ambientais e na responsabilização dos responsáveis, por meio de sua atuação na defesa da ordem jurídica e no cumprimento das normas legais. O IBAP destaca que as autoridades competentes, incluindo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), falharam gravemente ao não adotarem as medidas necessárias para garantir a segurança viária e a adequada fiscalização do transporte de substâncias perigosas.
O IBAP presta solidariedade às vítimas e familiares dos mortos, que merecem também as devidas assistências e reparações por parte dos responsáveis e dos órgãos públicos competentes.
Em relação ao transporte de substâncias perigosas, que é central neste caso, o Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97), em seu artigo 104, determina que o transporte de produtos perigosos deve obedecer a normas de segurança específicas para prevenir acidentes e danos ao meio ambiente e à saúde pública. O Decreto nº 96.044/88, que regulamenta o transporte rodoviário de produtos perigosos, também impõe requisitos rigorosos sobre a identificação da carga, o equipamento necessário para o transporte e a habilitação dos motoristas. Esses dispositivos foram desrespeitados, agravando o impacto do desastre ambiental.
A Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), em seu artigo 56, responsabiliza tanto pessoas físicas quanto jurídicas por danos ambientais causados por práticas irregulares no transporte e descarte de produtos perigosos, configurando crimes ambientais. O artigo 70 dessa mesma lei prevê a responsabilidade dos agentes públicos por omissões que resultem em danos ambientais, como no caso da negligência do DNIT em não garantir a segurança da ponte, já identificada como precária desde 2019, conforme relatórios do próprio órgão.
A Lei nº 12.305/10 (Política Nacional de Resíduos Sólidos) também estabelece a obrigação de gerenciamento adequado do transporte de substâncias perigosas, visando proteger a saúde humana e o meio ambiente, o que foi claramente desrespeitado no presente caso.
Este desastre é ainda mais grave quando se considera que ele configura uma violação das Convenções Internacionais das quais o Brasil é signatário, como a Convenção de Ramsar, que visa proteger zonas úmidas de importância internacional, e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável nº 3 (Saúde e Bem-estar) e 6 (Água potável e Saneamento) da Agenda 2030 da ONU, que possuem como metas associadas à redução das mortes e doenças por produtos químicos perigosos, contaminação e poluição do ar e do solo; redução das mortes e lesões por acidentes no trânsito; e garantir o acesso sustentável à água potável e a gestão integrada dos recursos hídricos.
O IBAP exige a apuração rigorosa da responsabilidade civil, penal e administrativa pelos danos causados e vidas perdidas. As autoridades federais e estaduais devem adotar medidas imediatas para minimizar os impactos ambientais, garantir a reparação dos danos e a devida punição para os responsáveis, conforme os dispositivos legais mencionados. O papel da Advocacia Pública é essencial para assegurar que a lei seja cumprida e que as vítimas, tanto humanas quanto ambientais, recebam a devida reparação.
O povo brasileiro e as comunidades ribeirinhas não podem ser mais uma vez vítimas de falhas estruturais, omissões administrativas e políticas públicas ineficazes. A responsabilização integral das autoridades competentes é imprescindível para a recuperação dos danos ambientais e a promoção da justiça.
IBAP – Instituto Brasileiro de Advocacia Pública
25 de dezembro de 2024.
Comentarios